Uma em cada 12 pessoas no mundo pode ter hepatite B ou C, sem saber. Não há sintomas e o vírus não é detectado em exames de rotina. Tem certeza que você não tem? Faça o exame, é gratuito.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Bate-papo sobre hepatite C: a importância da mídia na prevenção

Tive a honra de participar como palestrante do 10º Congresso de HIV/Aids 3º Congresso de Hepatites Virais, em João Pessoa/PB.

Participei da mesa sobre a importância da mídia na prevenção das hepatites virais, em 20 de novembro de 2015. Minha fala foi: "Como falar sobre prevenção às Hepatites Virais". Em seguida, Salete Barbosa, do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, falou sobre a campanha de hepatites de 2015. Ao final deste post, faço um resumo para vocês do que foi falado.  




Antes disso, quero compartilhar meu sentimento em relação ao evento: foi fantástico! Imagine uma super estrutura com palestrantes muito gabaritados, compartilhando informações atualizadíssimas. Se eu tivesse que resumi-lo em três palavras, eu diria: esperança, gratidão e diversidade.      

Esperança - enquanto eu ouvia sobre os resultados dos novos medicamentos e sobre a perspectiva para os próximos anos (mais de 50 remédios em fases avançadas de pesquisa), meus olhos se encheram de lágrima. Nunca nas hepatites vivemos um momento de tanta esperança. Queria que vocês tivessem a certeza que eu tenho após tudo o que tenho lido e ouvido: num curto espaço de tempo, a hepatite C estará apenas na História.  





Gratidão - por todas as pessoas que trabalharam e trabalham para isso ser possível. Gratidão também ao Governo Brasileiro, que virou referência no tratamento das hepatites virais no mundo [e pensar que há alguns anos só tínhamos críticas ao Programa de Hepatites, hein? Felizmente o cenário mudou e a prova é justamente o espaço que as hepatites tiveram neste Congresso de 2015]. Muito profissionalismo dos técnicos e vontade política de quem manda para que os novos medicamentos fossem disponibilizados pelo SUS, além de todas as outras ações realizadas. Gratidão também ao pessoal do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais e da Secretaria de Saúde do GDF. Foi um longo e árduo caminho até aqui. Ainda temos muito a percorrer, mas estou feliz que, finalmente, estejamos num momento tão favorável aos portadores de hepatite C no Brasil. [Se você bate panela e se irritou por ler isso, sinto muito. Este é um blog de opinião e essa é a MINHA opinião].


Diversidade - porque o Congresso trouxe participantes de todos os cantos do País, tivemos shows culturais diversos na Vila Social - como o que trazia pessoas caracterizadas como os orixás do Candomblé - e uma enorme quantidade de  pessoas com quem não convivo muito, como homens usando salto alto (tão alto que eu não conseguiria me equilibrar em cima dele) e transformistas encerrando o evento - eu nunca tinha visto antes; elas são completamente divas!!
Olha o salto desse moço!!

Apresentação na Vila Social

A Vila Social

Uma das divas que se apresentou no Encerramento


E, claro, é sempre muito bom reencontrar os amigos e conhecer novas pessoas.

O pop João Netto, ativista na luta contra o preconceito com o HIV

Nádia, do Hepatchê Vida

Jeová, do Grupo Esperança


Varaldo, do Grupo Otimismo (de olho na minha comida ahaha)

Conhecendo Laura Muller, sexóloga do Programa Altas Horas


Bate-papo: A importância da mídia na prevenção das hepatites virais

10º Congresso de HIV/Aids 3º Congresso de Hepatites Virais - João Pessoa, 20/11/2015


Como falar em prevenção em hepatites virais?
Ana Barcellos





Em primeiro lugar, devemos pensar: quem é o nosso público para uma campanha de prevenção, no que se inclui diagnóstico? Todos os brasileiros, mas em especial as pessoas nascidas entre 1945 e 1980.

Eu consigo atingir essas pessoas com o blog Animando-C? Não. Em geral, quem chega a este blog é familiar ou portador de hepatite C - ou minha família e amigos. As pessoas que não sabem que têm hepatite C não vão procurar um blog sobre hepatite C. Simples assim.

Então como atingir e sensibilizar essas pessoas? Gerando conteúdo que cheguem até elas, pelas mídias sociais ou tradicionais (rádio, TV, outdoor).

Para isso, considero algumas questões observadas nesses 6 anos de Animando-C:


1. O material deve gerar identificação. De nada adianta a pessoa ver/ouvir, se considerar que aquilo não é para ela. A informação entrará por um ouvido e sairá pelo outro. "Ah isso é só para quem é usuário de drogas ou promíscuo na vida sexual, que não é meu caso" Quer dizer, esforço inútil.

É por isso que eu me exponho. Claro que o melhor para mim seria eu ficar quietinha na minha vidinha, sem exposição, sem ser "aquela que tem hepatite C", sem me incomodar com gente cretina fazendo comentários não menos cretinos nas redes sociais. Mas no momento em que eu me exponho, eu - pessoa normal de classe média sem comportamentos considerados "de risco"- gero identificação. Então, prefiro pagar o preço e tentar ajudar a salvar algumas vidas. Isso é o que minha consciência me manda fazer.


2. Precisamos gerar conteúdos que as pessoas possam compartilhar sem exporem que têm a doença. As pessoas não precisam torná-la pública - elas têm esse direito justo e legítimo. Ao mesmo tempo, precisamos delas para compartilhar essas informações.


3. As pessoas não gostam de compartilhar "doença" em suas redes sociais.  Além disso, hepatite C não dá ibope. Primeiramente, porque a maior parte das pessoas não identifica como o perigo está muito perto. Então, é preciso criatividade.

Um exemplo que deu muito certo foi a campanha de selfies promovida pela ONG C tem que saber C tem que curar neste ano de 2015 - especialmente pela participação de artistas, que geram engajamento. Foram mais de 2,5 milhões de pessoas atingidas pela campanha, que virou notícia também na mídia, incluindo Globo, G1 e R7.  


4. Prerrequisito para comunicar prevenção em hepatite C: passar por cima de preconceitos - inclusive o nosso próprio. Quando eu me libero dos meus medos e preconceitos, eu permito que os outros também se liberem de seus medos e preconceitos. 



Apresentação da campanha de hepatites virais 2015
Salete Barbosa - salete.barbosa@aids.br

Em seguida, Salete Barbosa apresentou a campanha de hepatites do Ministério da Saúde em 2015, relatando os resultados positivos, como o boom de busca por testagem nos CTAs. 





A campanha de hepatite C era voltada para pessoas a partir de 49 anos e que fizeram cirurgia antes de 1993. As peças de hepatite B eram voltadas ao público jovem, focando a vacinação. Ambas visavam identificação, sem estereótipo.







A campanha foi veiculada em TV, rádio, mobiliário urbano (exemplo: paradas de ônibus), outdoor social (em local com menos condições de se chegar) e redes sociais. Você pode conhecer todas as peças no site do Ministério da Saúde.

A apresentação da Salete em muitos momentos fez um link com minha fala, que havia acontecido anteriormente. O público também participou com perguntas e considerações, o que foi muito bacana.

Eu não pude deixar de compartilhar que a primeira vez que ouvi o spot no rádio, meus olhos se encheram de lágrimas e pensei: "agora sim estamos dando chance para as pessoas saberem!". Gratidão por essa campanha - a primeira até agora que, de fato, contou com o investimento que o problema merece. Palmas a todos os envolvidos!

Outras fotos do Congresso:








Clique na imagem para ampliá-la

Clique na imagem para ampliá-la

Dr. Fábio Mesquita falando no encerramento

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Carta ao vírus da Hepatite C

Prezado vírus da hepatite C,

Faz um longo tempo que estamos juntos. 29 anos e 5 meses, para ser exata - apesar de eu saber de sua existência apenas há 10 anos. Você esteve comigo nos momentos mais importantes da minha vida, mas agora é hora de ir.

Você já cumpriu seu papel e sou grata por você ter me dado a oportunidade de conhecer pessoas incríveis, de ajudar pessoas por meio deste blog e palestras gratuitas, por ter unido mais a minha família e me possibilitado me transformar numa pessoa melhor. Por causa disso, perdoo todo o mal que você me causou, incluindo os danos ao meu organismo e os seis meses de tratamento com interferon e ribavirina em 2008.

Esta é uma carta de despedida, pois hoje estou começando o tratamento com sofosbuvir e simeprevir e tenho muita fé que em três meses já não estaremos mais juntos. Se existir Céu (ou Inferno) dos vírus, que você descanse em paz. Não guardo ódio nem mágoa.

Grata por todo o aprendizado, vá em paz e não volte nunca mais. Nossa parceria termina aqui.


Adeus,
Ana



Coisa mais linda ver essas caixas no meu armário da cozinha


quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Começar de novo... novo tratamento

Eu observava atentamente os movimentos do farmacêutico. Após me prestar várias informações e anotar todos os dados importantes para acompanhar o meu tratamento, ele levantou, abriu o armário e tirou de lá duas caixas verdes com tarja vermelha.

No momento em que ele colocou os medicamentos na mesa, eu comecei a chorar. Levei alguns minutos para conseguir tocá-los e quando o fiz, não sei descrever o que eu senti. Uma alegria enorme, alívio, esperança e um pouco de medo.     

Minha filha - que está com 8 anos de idade - estava ao meu lado. Quando eu contei que pegaríamos os remédios hoje, ela arregalou os olhos e perguntou:

- Você vai ficar curada, Mamãe?
- Vou, meu amor - eu respondi. 

Ao que ela respondeu com um grito de ebaaaaaa e me deu um abraço apertado. Talvez o mais apertado que tenha me dado até hoje. 

Começa agora uma nova jornada, que terá a duração de 3 meses. Uma nova batalha, que estou certa que vou vencer. Como pode em duas pequenas caixas caber tamanha esperança?

Peço licença a todos, porque agora vou deitar. Não vejo a hora que chegue logo amanhã... 


Alea jacta est  [A sorte está lançada]


Quem receberá os novos remédios para Hepatite C agora?

Se existe algo que todos os portadores de hepatite C têm em comum desde o momento em que recebem o diagnóstico é: todos nós queremos ficar curados. Confere? 

O momento que vivemos hoje é de muita esperança e otimismo em todo o mundo. Vislumbra-se nas próximas décadas a erradicação da doença. Obviamente, todos querem começar a tomar logo os novos medicamentos recém incorporados ao SUS. No entanto, quem terá direito à medicação imediatamente?

Indicação de tratamento: A  terapia  será  indicada  nos  pacientes  que  apresentarem  resultados  de  exame  que indicam  fibrose  hepática  mais  severa  (METAVIR  F3  ou  F4) e  que  não  tenham  sido  tratados  anteriormente  com  daclatasvir, simeprevir ou sofosbuvir.  

Indicações de tratamento imediato: A terapia também estará ao acesso de
pacientes que possuam os seguintes critérios de indicação  de  tratamento  imediato,  desde  que  não  tenham  sido  tratados  anteriormente  com
daclatasvir, simeprevir ou sofosbuvir:

  • Coinfecção com o HIV
  • Manifestações  extra-hepáticas:  porfiria  cutânea,  líquen  plano  grave  com envolvimento de mucosa.
  • Crioglobulinemia com manifestação em órgão-alvo (olhos, pulmão, sistema nervoso  periférico  e  central),  Glomerulonefrite,  Vasculites  e  Poliarterite Nodosa.
  • Sinais  clínicos  ou  evidências  ecográficas  sugestivas  de  cirrose  hepática (varizes de esôfago, ascite)
  • Insuficiência     hepática     e     ausência     de     carcinoma     hepatocelular, independente da necessidade de transplante hepático
  • Insuficiência renal crônica
  • Púrpura Trombocitopênica Idiopática (PTI)
  • Pós-transplante de fígado
  • Fibrose hepática avançada (METAVIR F3 ou F4)
  • Biópsia hepática com resultado METAVIR F2 há mais de 3 anos


Fonte: Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Hepatite C e Coinfecções
SUGESTÃO: Leia esse documento completo. Ele contém informações riquíssimas sobre a hepatite C. O conhecimento é a nossa maior arma.

Agora a pergunta que não quer calar:

Flor, você se enquadra neste protocolo?

E a resposta é... SIM!! uhuuuuuuuu
  • Biópsia hepática com resultado METAVIR F2 há mais de 3 anos [2008, no meu caso]

Já tive a infelicidade de ouvir que eu não merecia fazer o tratamento agora porque tem gente muito pior do que eu [acreditam??]. Olha, quem está pior do que eu, também está contemplado no protocolo e todo mundo vai receber a medicação, porque já está tudo compradinho e estocado. :)

Na minha opinião, não existe quem merece mais ou merece menos. Cada vida é uma vida, incomparável e insubstituível. Todos merecem. É claro que os administradores precisavam definir uma estratégia para tratamento imediato e esses critérios foram definidos com muita base e discussão científica.


- Flor, eu não estou contemplado no protocolo. O Governo quer que eu morra?

Nada disso! Ninguém está dizendo que você é menos importante. O que se está dizendo é que - felizmente! - você está bem e não precisa ainda fazer o tratamento. Isso é motivo de comemoração e não de frustração! Quando você precisar, os remédios estarão lá esperando por você - o que é uma enorme conquista da população brasileira!

Ok, eu sei que a gente fica frustrado porque quer ficar curado logo e se livrar desse pesadelo. Já passei por isso em 2005 quando tive o meu pedido de tratamento negado pelo SUS e pelo meu plano de saúde, então sei muito bem como nos sentimos nessa hora. Mas na época eu procurei pensar que tudo acontece na hora certa. Como tenho fé, confiei em Deus e nos caminhos que Ele traçava para mim. E pensei em todos os novos medicamentos que estavam em estágio avançado de pesquisa, acreditando que talvez fosse um daqueles que me curaria e não o interferon e ribavirina disponíveis na época. 

E não é que agora, 10 anos depois, existem dezenas de novos medicamentos sendo testados, com EXCELENTES resultados preliminares? A perspectiva para os próximos anos não poderia ser melhor! Então não percam a esperança, não se desmotivem. A hora de todos vai chegar!

Quem não quiser esperar, pode buscar seus direitos na justiça. É uma decisão pessoal. Em 2005, decidi não fazer isso porque não queria me expor a um desgaste maior do que eu já estava tendo com a descoberta da doença. E confiei.

Minha vez chegou em 2008 e o tratamento não deu certo, apesar de todo o sofrimento. E agora chegou de novo. Estou muito animada, é claro. E espero ter boas notícias para compartilhar com vocês em breve.  Boa sorte para todos nós!